quinta-feira, 28 de junho de 2012

Chegou o inverão

Iniciado o verão, com o solstício, este parece vir menos quente, pelo menos para uns, e, mesmo a jeito com o acordo ortográfico, deve grafar-se com “v” minúsculo.

Por um lado, a construção civil parada; o turismo coartado de substancial parte de turistas nacionais e pelas falhas da operação com o norte da Europa; a restauração arrasada com o brutal aumento do IVA; a contração no consumo pelo aumento no IRS, a redução no crédito e a inexistência de subsídios de férias na função pública. Por outro, não negligenciemos uma parte relevante da população que, ainda que afetada pelo mesmo contexto económico, mantém em essência os seus rendimentos, e algumas empresas em setores mais privilegiados que podem dar algum fôlego a uma base económica fragilizada.


Face a um crescente iberismo económico, olha-se com preocupação a Espanha, na altura em que o nosso setor exportador parecia vir a ser menino do quadro de honra, ao mesmo tempo que nos preparamos para fazer parte de um clube cada vez maior de (potenciais) auxiliados pela troika, com garantia teórica de consolidação da nossa posição contratual, quando falida a receita da “austeridade” se ensaia um embrionário pendor de “crescimento”. 

O verão mudou de sinónimo, como é certo que os países quentes do Sul, em tempo de estio, sentem mais o frio e até nuestros hermanos deixaram cair os abanicos, com que de certo modo nos iam aliviando dos calores que por cá ainda subsistiam. Não é um verão caribenho, mas é o verão possível!

Açoriano Oriental, 28 de junho de 2012

quinta-feira, 21 de junho de 2012

hip hip hurray

Veio entrando de mansinho, pezinhos de lã, mas já cá o temos inteirinho, com a qualidade exigida pela troika e tudo – o novo código do trabalho.

Nem o mais alto dignitário da Nação teve muitas dúvidas em promulgar o novo Código, justificando que só 15% dos deputados haviam votado contra e não havia “indícios claros de inconstitucionalidade”- esteve bem nos “claros” o senhor.

De uma assentada, que é mais ou menos como se o morto saísse do caixão para a discoteca, alteram-se - com os pratos da balança, um a roçar o céu, outro assente no chão… - os requisitos de despedimento; as compensações por cessação do contrato de trabalho; os tempos de trabalho (bancos de horas, compensações, férias e feriados); as remunerações (com possível indexação à produtividade e a diminuição do valor pago por horas extra); e a vigência e efeitos das convenções coletivas de trabalho, sendo que aqui havia que impor alguma disciplina face ao caos que vigorava.

Facto é que Portugal, com exceção de 15% e das dúvidas constitucionais dos indícios menos claros, enveredou por um liberalismo ativo, tão certo como de boas intenções estarmos cheios, troikas incluídas.

As empresas agradecem tanta bonomia em época de austeridade, pelo menos até ao ponto em que as eventuais reduções de rendimento não redundarem em diminuições de consumo, e o País fica expectante se tanta liberdade vai dar mais produtividade e riqueza - hip hip hurray ao PIB, ou se vai reduzir o emprego - hip hip hurray ao (des)emprego.

Açoriano Oriental, 21 de junho de 2012

quinta-feira, 14 de junho de 2012

Desenhos Animados

Disseram-me outro dia que a RTP Açores voltou ao que era depois do 25 de Abril. Questionei, com ironia, se agora também estava a começar a emissão com desenhos animados. Recebi um sorriso. Retorqui com outro.

A “nossa televisão” foi forçada a mudar-se sem que se tenha ainda percebido bem o que afinal daqui resultará.

Mais uma vez, a pedra de toque para a mudança foi económica - o custo exagerado, a que uns responderam que há coisas que não têm preço, que era um ataque ignóbil à autonomia. Ninguém poderá negar é que custo havia e não era pouco.

Somos mais açorianos se o que emitimos pelo nosso canal não é maioritariamente nosso ou, sendo-o, passa por um rol interminável de coroações, bodos de leite, procissões, ou outros eventos de toda e qualquer espécie? Tínhamos a televisão como nossa, íamos lá quando queríamos anunciar toda e qualquer atividade – divulgação cultural ou publicidade paga pelo erário público? A televisão era nossa, mas tornava-nos mais açorianos… ou dispersava-nos do essencial?

A matriz criada pode ter sido imposta, mas não é certo que esta televisão seja pior do que a outra. Talvez o que mais custe é ser esta versão de televisão um diktat da República que, tendemos a esquecer, também é a nossa.

Que se faça uma análise do que se quer e para que servem as coisas que temos e não tomemos nada por garantido, especialmente se não é lícito que implementámos a melhor solução, e, ainda que possamos ter o direito, se não pagamos as contas e quem as paga não tem dinheiro.

Açoriano Oriental, 14 de junho de 2012

quinta-feira, 7 de junho de 2012

Economia Ferial

Escrevo-vos neste dia de Corpo de Deus, em quinta-feira feriado, festa instituída pelo Papa Urbano IV, e em Portugal por D. Dinis em 1282, quando parece consensualizado que este e outros tantos feriados vão ser extintos.

O tema dos feriados, pontes e afins foi levantado por uma questão económica. De facto, restam poucas dúvidas de que se as pessoas trabalharem mais a produção aumenta (até certo ponto), mas disto a cortar-se a direito vai uma grande distância. Algum bom senso porém, diga-se, encarnou nas almas que acabaram por legislar nesta matéria.

Sobre os feriados – os feriados deveriam ser primeiro pensados isolados da questão económica. Se há interesse em relembrar um momento da história ou cultura devem obviamente comemorar-se, no dia certo. Não creio que se tenha feito a reflexão séria sobre o que, e quando, comemoramos.

Sobre as pontes – se as pessoas faltam num determinado dia de ponte, os mecanismos legais devem ser postos em prática para justificar ou punir essa ausência, o que raramente foi feito.

Sobre as tolerâncias de ponto – resumem-se a um ofertório direto privilegiado do erário público aos trabalhadores do Estado e têm, portanto, um caráter discriminatório.

Com menos feriados – e, já agora, menos dias de férias –, Portugal passa de ligeiramente acima da média para o fundo da tabela de dias de descanso na Europa.

Aguardemos, então, por 2013, porque não em jubilosa esperança, pelo grande aumento do nosso PIB, com o fim dos feriados, mas… aguardemos sentados.

Açoriano Oriental, 7 de junho de 2012